terça-feira, 23 de junho de 2015

Casa de Vidro - Instituto Lina Bo e P. M. Bardi

[Mayra Biajante - SP] Foi um domingo de outono, daqueles que o sol parece fraco, mas esquenta a pele e tem sempre um vento fraco pra gelar um pouquinho. Um dia lindo, em que escolhi passar a manhã na Casa de Vidro. Um domingo pra se encantar.

Localizada no bairro do Morumbi, a Casa de Vidro foi a residência da arquiteta e Lina Bo e seu marido P. M. Bardi, marchand, crítico de arte e jornalista. O casal veio da Itália para o Brasil em 1946 e não deixou mais o país.
Além da Casa de Vidro, Lina projetou o Masp e o Teatro Oficina, além do restauro do Sesc Pompéia, obra referencial de lazer da cidade, entre muitos projetos e exposições pelo país afora. Lina também trabalhou como designer, cenógrafa, editora de revistas, curadora de museus e exposições e estilista.

A Casa foi construída em 1951, e é um marco da arquitetura Modernista de São Paulo e um exemplo de conservação da mata atlântica.

Desde 1990, se tornou o Instituto Lina Bo e P. M. Bardi. O acervo pessoal do casal, reunido por toda a vida, constituído por obras de arte, móveis, documentos, objetos, desenhos de Lina e muitas fotografias foi doado ao instituto. O local também foi tombado como patrimônio histórico.

Atualmente o instituto realiza a exposição Lina em Casa: Percursos. Com curadoria de Renato Anelli e Anna Carboncini, revela o pensamento cotidiano da arquiteta.
Caminhar por aquele lugar, repleto de objetos e móveis antigos e lembranças da vida que havia alí como vídeos, desenhos, revistas e livros foi incrível e inspirador. Da sala com paredes de vidros, que dão significado ao nome ao nome da casa, é possível observar o quintal tomado pela natureza, que também interage com a construção (uma árvore enorme é um tipo de ponto central do lugar, sendo observada de vários pontos). Pelo quintal, percebe-se a delicadeza com que tudo foi construído: os muros de arrimo foram enfeitados com pedrinhas e azulejos que formam desenhos de flores. Tudo foi pensado pra ser um lar.


Essa é a questão que me fez admirar o trabalho de Lina. Ela explorava o conceito de arquitetura antropológica; em todas as suas obras, buscava explorar o contexto humano e cultural. Os projetos eram feitos com o objetivo de servir as pessoas que o utilizariam, sempre com espaços simples, fáceis de entender e usar.

Ao sair dalí, deslumbrada pela beleza do lugar e sua história, senti saudade de um tempo que eu não vivi. Senti vontade de ter conhecido a Lina Bo Bardi e seu marido, caminhar pela casa e seu quintal maravilhoso na época em que foi habitada. Seria uma experiência linda.

Visite:
Exposição Lina em Casa: Percursos
Instituto Lina Bo e P. M. Bardi
Rua General Almério de Moura, 200 – Morumbi – São Paulo.
Aberta de 12 de abril a 19 de julho.
De quinta a domingo das 10h às 16h00 (com permanência até 16h30).
Entrada franca.
http://goo.gl/RY2m0Q

( Mayra Biajante é colaboradores deste blog, conheça mais de seu trabalho acessando https://www.facebook.com/mayrabiajantefotografia?fref=ts )

quarta-feira, 17 de junho de 2015

A transposição do rio São Francisco sob um olhar historiográfico

Cachoeira de Paulo Afonso, E. F. Schute (1850). Acervo do MASP
Cerne de debates intensos nos últimos anos, a transposição do rio São Francisco é um dos principais empreendimentos de infraestrutura em andamento hoje no Brasil. Sua grande premissa é a de levar água para áreas com os menores índices de chuva no país. Os questionamentos ao projeto, entretanto, não são poucos. Além das controvérsias quanto aos impactos ambientais e ao alcance dos benefícios, os custos crescentes e o grande atraso nas obras têm esquentado as discussões sobre o tema.

No entanto, levar águas do São Francisco para outras paragens não é um projeto de todo novo. Em meados do século XIX, por exemplo, a ideia de obras hidráulicas similares foi alvo de debates acalorados.

Com o intuito de pensar a historicidade desse tipo de proposta, Gabriel Pereira de Oliveira defendeu no último dia 2 de junho, em Belo Horizonte, a dissertação “O rio e o caminho natural: propostas de canais do São Francisco, aspectos físicos fluviais e dinâmicas políticas no Brasil Império (1846-1886)”, pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. O trabalho teve a orientação da professora Regina Horta Duarte (UFMG), e participaram da banca de avaliação os professores Eurípedes Funes (UFC) e Júnia Furtado (UFMG).

Em diálogo com pressupostos do campo da História Ambiental, história da cartografia, história das ciências, além da historiografia sobre o Brasil Império, a dissertação analisa as proposições dos então chamados canais para o São Francisco entre 1846 e 1886. Durante esse período, a canalização relacionou-se de modo bastante singular com aspectos políticos e econômicos da nação que buscava se afirmar sob a batuta dos valores do mundo moderno.

Defesa da dissertação de Gabriel Pereira de Oliveira

Por meio da análise de fontes como mapas, estudos de engenheiros e discursos parlamentares, a dissertação se pauta na compreensão dos planos de canalização em meio aos litígios especialmente pelo controle do São Francisco e em torno da questão das secas. A ideia é ver como as propostas de canais, articuladas a projetos de poder, fizeram-se imersas em disputas acirradas sobretudo com planos de estradas de ferro e de açudes. Nesses conflitos em torno de arranjos do território nacional, grupos de diversas províncias buscaram legitimar as projeções que lhes seriam mais convenientes como as mais adequadas, os caminhos naturais do rio.


Embora os projetos de canal não tenham sido realizados na época, o conhecimento de suas discussões e mesmo de sua não concretização pode contribuir à reflexão sobre as relações entre seres humanos e natureza, bem como sobre contendas e arranjos políticos no Brasil oitocentista. Além disso, se hoje tende a parecer lógico que a transposição se volte ao combate à seca, o estudo dos sonhos daquelas obras hidráulicas no século XIX pode ser fundamental à compreensão de como as motivações e os contornos do projeto não são tão óbvios assim, mas vem desenhando-se sob aspectos bastante peculiares no decorrer do tempo e em diferentes espaços, imersos nas relações entre água e poder.

Para saber mais, abaixo o link para escutar o programa de rádio sobre o tema