Donald Worster é professor emérito do Departamento de História da Universidade do Kansas nos Estados Unidos e um dos diretores do Centro para História Ecológica da Universidade Remin da China, em Beijing, tem se dedicado a pesquisas no campo da História Ambiental, especialmente os temas que abordam ciência, tecnologia e agricultura.
Em 2009 foi nomeado como membro da Academia Americana de Artes e Ciências.
Foi presidente e um dos fundadores da Sociedade Americana de História Ambiental.
Leia a entrevista do professor Donald Worster ao jornal O Globo em 10 de Março de 2013.
Como a natureza influencia a História?
A natureza, incluindo não apenas plantas e animais, mas também micro-organismos, vermes, vírus, recursos naturais, ou seja, a natureza em todas as suas dimensões, tem um grande impacto na vida humana. Se não temos água, temos um problema. Mas se temos água demais também. Muitos desastres são provocados pela natureza. As epidemias têm um grande impacto na História. Mesmo as guerras podem ser provocadas por questões ligadas à natureza, como a escassez de recursos. A natureza é de onde viemos em termos de origem e não podemos escapar de sua poderosa influência. Muitas pessoas podem não perceber isso porque vivemos em cidades, cercados de tecnologia, e pensam que se trata de um mundo feito pelo homem, em que não há forças naturais. Mas, certamente, somos muito influenciados pela natureza. Não somos tão poderosos quanto pensamos.
Historiadores costumam separar natureza de cultura. Por que?
Parte de uma longa tradição da Humanidade pensar literatura, filosofia, história como criações da mente humana e não como parte do mundo natural. Há o campo das humanidades e o das ciências. As ciências são com a natureza, as humanidades lidam com pessoas. Tendemos a dividir o mundo assim, não sei de onde vem isso, talvez da religião. E acho que isso nos cega para o fato de que as humanidades têm muito a ganhar compreendendo a natureza. E que há questões que não podem ser resolvidas só cientificamente.
O senhor citaria um exemplo?
As mudanças climáticas são um bom exemplo. A ciência explica o quanto de carbono está indo para a atmosfera, tem modelos para prever que vai acontecer, esclarece a dinâmica de todo o processo. Mas não explica por que queimamos combustível fóssil ou por que gostamos tanto de carros. Essas são questões culturais. E qualquer solução para o problema das mudanças climáticas vai requerer ciência, mas também compreensão da cultura humana e mudança social.
A história ambiental une os dois?
Comparada à história política e à história social, sim. Todos deveríamos ir à ciência em busca de dados, formar alianças, quebrar barreiras. Poderíamos ver o mundo de maneiras diferentes.
O senhor aplica a teoria da Evolução de Darwin à História. Como isso funciona?
Podemos falar de mudanças históricas como um processo de adaptação ambiental. Isso é bom para pensarmos por que fazemos as coisas de determinada maneira, por que criamos esta ou aquela tecnologia. Muitas vezes, estamos respondendo a algo. São adaptações à natureza ou a mudanças que nós mesmos fizemos no mundo. Então, tudo está evoluindo e mudando o tempo todo. É uma coevolução, uma coadaptação. A cultura não pode ser compreendida como a cor das penas de um pássaro ou os padrões comportamentais de formigas na floresta tropical; ela não é determinada pela genética. Mas não é uma coisa estática. Fazemos determinadas coisas porque o mundo em que vivemos está em constante movimento e precisamos sobreviver.
Parece, no entanto, que nos adaptamos mal. As mudanças climáticas seriam um boa prova disso, não?
Sim, de forma geral, parece que muito do que fazemos é não adaptar. Ignoramos os padrões e os limites do mundo. Mas temos que aprender a nos ajustar ou estaremos sempre mal adaptados. Vamos mudar uma plantação de lugar ou construir muros em torno das cidades para manter o mar longe? Seria melhor pensar em energias alternativas, não? O fato é que vamos nos adaptar de uma maneira ou de outra, não há escapatória. Mas podemos fazer isso bem ou mal. Ou tão mal que as sociedades desapareçam — conhecemos exemplos do passado. Mas não sou tão apocalíptico, não acho que a Humanidade vai acabar.
O tema de sua palestra no Rio é “Da era da abundância à era da vulnerabilidade”. Estamos perto do limite?
Isso veio de um livro lançado nos EUA em 1972 que foi um grande best seller e que levantava essa questão sobre como vamos ajustar economia, consumo, poluição, dinheiro e bem-estar. Questões que não desapareceram. E essa era começa com a descoberta da América por Cristóvão Colombo. É preciso lembrar que na Europa, na Idade Média, o capitalismo não era a forma dominante de pensar a economia, a agricultura era em pequena escala e havia uma grande noção de escassez e limites. A descoberta de uma grande quantidade de recursos naturais, como água e minérios, mudou profundamente sua forma de ver o mundo, o capitalismo, o comércio, os negócios em escala global. Vivemos na fronteira do novo mundo.
Essa era acabou?
Estamos alcançando um ponto em que todos dizem que essa era acabou. Não haverá outra América, outro Brasil. A Lua não vai servir, nem Marte. Isso é normal, a História é feita de ciclos, embora muitas pessoas tenham problemas para se ajustar. Os economistas têm mais dificuldade, mas mesmo eles já estão falando em economia ecológica, economia ambiental. Temos que pensar em soluções, em como viver num mundo de limites.
Podemos voltar a modelos antigos?
Não será um mundo como no passado, com pequenas vilas, cosmologia religiosa e sem revolução científica. Não vamos voltar a isso. A História não volta. Mas podemos ter ecos do passado, talvez vivermos em comunidades menores, descobrir novas formas de energia, usar o conhecimento científico e tecnológico que adquirimos ao longo dos anos para criar um novo tipo de cultura, que seja compatível com o meio ambiente.