sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Disciplina História e Natureza na UFRJ


Disciplina: História e Natureza - Prof. José Augusto Pádua - UFRJ
Horário: 18h00 às 21h00 

A construção do conceito de “natureza”, como categoria unificadora de uma realidade extremamente complexa e diversificada, constitui um dos pilares do pensamento ocidental. Desde a antiguidade clássica, a formação da idéia de sociedade humana passou por um conjunto de oposições onde o conceito de natureza (physis, natura) representou uma parcela decisiva: natureza versus lei; natureza versus técnica; natureza versus espírito; natureza versus arte; natureza versus história. Ou seja, um conjunto de diferenciações que procurou estabelecer a especificidade do fenômeno humano diante do referencial básico da natureza.

De toda forma, a convivência obrigatória com as estruturas e processos biofísicos que existem no planeta Terra, incluindo a diversidade de espécies que nele evoluem, define um aspecto essencial da experiência histórica dos seres humanos. Tal convivência, assim como a produção cultural de imagens e concepções sobre o mundo natural, representa um dos fundamentos mesmos dessa experiência histórica, na medida em que: 1) a existência humana expressa-se necessariamente através de atos biológicos e 2) as paisagens, tecnologias e representações produzidas pela ação humana manifestam-se sempre na interseção entre espaços / elementos naturais específicos e movimentos de apropriação / transformação significativa dos mesmos através de ações coletivas.

A relação entre a tradição historiográfica e o tema da natureza foi sempre tensa e ambígua, até mesmo pelo fato da primeira basear-se em grande parte no movimento de afirmação da sociedade humana através da negação dos seus vínculos naturais. Uma parcela considerável da tradição historiográfica desqualificou radicalmente a relevância do mundo natural para o entendimento da trajetória humana. Outra parcela desaguou na falácia do determinismo geográfico/ecológico, que toma o natural como eixo mono-causal de explicação da vida social.

No contexto da contemporaneidade o quadro teórico tornou-se mais complexo e menos dualista. As ciências naturais adquiriram maior sofisticação teórica, aproximando-se da perspectiva histórica ao entender a natureza como uma realidade em constante transformação, longe da imagem tradicional de um cenário estável e permanente. O diálogo da história com a ecologia e a geografia vem inspirando análises cada vez mais finas.  A politização do tema da natureza no espaço público, por outro lado, é cada vez mais intensa, desafiando a reflexão dos cientistas sociais.

Esse conjunto de desafios teóricos e políticos tem estimulado o surgimento de uma literatura rica e instigante que procura renovar a compreensão do lugar da natureza na história humana – e da história humana na natureza – valendo-se de instrumentos conceituais mais sofisticados e de estratégias analíticas mais elaboradas. Tal renovação teórica não está limitada aos historiadores ligados à corrente específica da “história ambiental”, que vem crescendo institucionalmente em diferentes países, mas inclui o esforço intelectual de nomes notáveis como Fernand Braudel, Keith Thomas, Raymond Williams, E. Le Roy Ladurie, Simon Schama e outros.

Dentro deste panorama, o curso pretende discutir, mesmo que de maneira seletiva, o estado da arte do tratamento do tema da natureza na historiografia contemporânea. A discussão focalizará alguns trabalhos especialmente relevantes, agrupados segundo determinados eixos conceituais e temáticos que possam fornecer uma clara indicação da riqueza, densidade e relevância das análises.
  
PROGRAMA E BIBLIOGRAFIA BÁSICA
  
* Aula 1 –  Introdução Geral ao Tema e ao Programa
  
-Pádua, J.A. “As Bases Teóricas da História Ambiental”,  Estudos Avançados, 24 (68), 2010.


- PARTE I:  A RELAÇÃO ENTRE NATUREZA E HISTÓRIA COMO PROBLEMA TEÓRICO


* Aulas 2 e 3:  Conceitos de Natureza e Teorias da História

- Williams, R. “Idéias de Natureza” in Cultura e Materialismo (UNESP, 2011).
 - Braudel, F. “Há uma Geografia do Individuo Biológico?” in Escritos sobre a Historia (São Paulo, 1992)
 - Arnold, D. The Problem of Nature (Oxford, 1996).


* Aulas 4 e 5: Além do Dualismo: O Diálogo Necessário entre História, Antropologia e Ecologia

- Levi-Strauss, C. “Estructuralismo y Ecologia”  (Madrid, 1976)
 - Descola, P., “Constructing Nature: Symbolic Ecology and Social Practice” in P. Descola e G. Pálsson, Nature and Society: Anthropological Perspectives (London, 2002).
 - Descola, P.  “Estrutura e Sentimento: a Relação com o Animal na Amazônia”, Mana, 4 (1), 1998.
 - Descola, P.  Par-delà Nature et Culture (Paris, 2005)
 - Viveiros de Castro, E. “Imagens da Natureza e da Sociedade” in E. Viveiros de Castro, A Inconstância da Alma Selvagem (São Paulo, 2002).
 - Asdal, Kristin. “The Problematic Nature of Nature: The Post-Constructivist Challenge to Environmental History”, History and Theory, n. 42-1, 2003.
 - Cronom, W. “In Search of Nature” e “The Trouble with Wilderness”  in W. Cronom, Uncommon Ground: Toward Reinventing Nature (New York, 1996).
 - Worster, D., “Nature and the Disorder of History” in M. Soulé e G. Lease, Eds, Reinventing Nature?: Responses to Postmodern Deconstruction (San Francisco, 1995).


- PARTE II: O TEMA DA NATUREZA NA HISTORIOGRAFIA CONTEMPORÂNEA – ALGUNS CONCEITOS FUNDAMENTAIS


* Aulas 6 e 7 – Darwinismo, Ecologia e a Radicalização do Enfoque Histórico no Entendimento da Natureza e da Humanidade

- Norris, M. “Darwin’s Reading of Nature” in M. Norris, Beasts of the Modern Imagination (Baltimore, 1985).
 - McNeill, W. “Passing Strange: The Convergence of Evolutionary Science with Scientific History”, History and Theory, n. 40 – 1, 2001
 - Drouin, J-M. L’Ecologie et son Histoire: Réinventer la Nature (Paris, 1991)
 - Maturana, H. e Varela, F. A Árvore do Conhecimento: as Bases Biológicas da Compreensão Humana (São Paulo, 2010).


* Aula 8 – Revisitando a Relação entre Geografia e História

- Alan Baker, Geography and History: Bridging the Divide (Cambridge, 2003)

- Williams, M., “The Relations of Environmental History and Historical Geography”, Journal of Historical Geography, n. 20-1, 1994.


* Aula 9 e 10 – Região, Paisagem e História.

- Duby, G. “Quelques Notes pour une Histoire de la Sensibilité au Paysage”, Études Rurales, 121-124, 1991.
 - Dubost, F. “La Problématique du Paysage: État des Lieux”, Études Rurales, 121-124, 1991.
 .- Corbin, A.  L’Homme dans Le Paysage (Paris, 2001)
 - Schama, S.  Landscape and Memory (London, 1995)
 - Mitchell, W., org., Landscape and Power (Chicago, 2002)
 -  Malpas, J., org., The Place of Landscape (Cambridge, 2011)
 - Braudel, F. O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrânico na Época de Filipe II (Lisboa, 1983)
 - Braudel, F., org., O Espaço e a História no Mediterrâneo (São Paulo, 1988).
 - Freyre, G. Nordeste: Aspectos da Influencia da Cana sobre a Vida e a Paisagem do Nordeste do Brasil (Rio de Janeiro, 1985)

- Holanda, S. B. de, Caminhos e Fronteiras, São Paulo, Companhia das Letras, 1994



- PARTE III:  A NATUREZA COMO PROBLEMA HISTORIOGRÁFICO – ALGUNS TEMAS FUNDAMENTAIS


* Aulas 11 e 12 – A Floresta como Objeto Historiográfico

- Harrison, R.  Forests: The Shadow of Civilization (Chicago, 1992)
 - Radkau, J.  Wood: a History (London, 2012)
 - Dean, W. A Ferro e Fogo: A História e a Destruição da Mata Atlântica Brasileira (São Paulo, 1999)
 - Corvol, Andrée,  Les Arbres Voyagers (Paris, 2005)
 - Williams, Michael,  Deforesting the Earth  (Chicago, 2003)


* Aulas 13 e 14: A Circulação de Plantas e Animais como Objeto Historiográfico.
  
- Beinart, W.e Middleton, K., “Transferência de Plantas em uma Perspectiva Histórica”, Topoi, 19 (10), 2009.
 - Russel-Wood, A.J.R, “Dissemination of Flora and Fauna”, Cap. V de A.J.R Russel-Wood, The Portuguese Empire: a World on the Move (Baltimore, 1998)
 - Kiple, Kenneth, A Movable Feast: Ten Millennia of Food Globalization (Cambridge, 2007)
 - Crosby, A., Ecological Imperialism: The Biological Expansion of Europe – 900/1900 (Cambridge, 1986)

* Aula 15 – Doenças como Objeto Historiográfico

 - Le Roy Ladurie,  E. “Un Concept: L’unification Microbienne du Monde” in E. Le Roy Ladurie, Le  Territoire de L’Historien 2 (Paris, 1978)
 - Cook, N. D., Born to Die: Disease and the New World Conquest – 1492/1650 (Cambridge, 1998)
 - Watts, S.  Disease and Medicine in World History (London, 2003)
 - Crosby, A., Ecological Imperialism: The Biological Expansion of Europe – 900/1900 (Cambridge, 1986)


* Aula 16 – O Clima como Objeto Historiográfico

- Le Roy Ladurie, E., Histoire Humaine et Comparée du Climat, 2 vols  (Paris, 2004-2006)
 - Le Roy Ladurie, E., Abrégé d´Histoire du Climat: Du Moyen Age à Nos Jours (Paris, 2007)
 - Ruddiman, W.  Plows, Plagues and Petroleum: How Humans Took Control of Climate (Princeton,    2005)
 - Acot, Pascal, Histoire du Climat (Paris, 2004).

Nenhum comentário: