domingo, 25 de dezembro de 2011

A natureza nos escritos do padre Antônio Vieira

Em entrevista conduzida por Marcos Flamino Peres a revista Cult (164), o professor de literatura brasileira da USP, Alfredo Bosi falou sobre o padre Antônio Vieira, considerado por Fernando Pessoa o "imperador da língua portuguesa".

Sob o título "O orador das multidões", a entrevista revela o seguinte argumento de Bosi: Vieira foi ao mesmo tempo crítico e defensor do sistema colonial. Apesar de sempre me interessar pelos assuntos referentes à história colonial, este post é para destacar uma pergunta muito cara aos objetivos deste blog, acompanhe na íntegra a questão e a resposta:

CULT - Como se dá a relação entre Escrituras e natureza em sua oratória [referindo-se a Vieira]?

Bosi - A natureza é fonte de metáforas do Antigo ao Novo Testamento. É só abrir o Cântico dos cânticos, atribuído a Salmão, para encontrar belíssimas imagens naturais do amor humano que a exegese cristã sublimou na união do fiel com Deus.
As parábolas do Evangelho falam em lírios do campo, sinais do esplendor da natureza que nem todo esforço dos homens conseguiu criar, ou no arbusto de mostarda brotado da menor das sementes, mas em cujos ramos vêm abrigar-se os pássaros do céu.
Transpostas para a esfera moral, há árvores abençoadas que dão frutos e árvores estéreis que merecem a ação do machado e do fogo. Não é, pois, de estranhar que a oratória sacra se tenha valido de comparações entre o mundo moral e a infinita variedade dos aspectos da natureza.
Como exemplo dessa simbiose, há dois célebres sermões.
O "Sermão da Sexagésima" funda-se na parábola do semeador, cujas sementes caem em terrenos diversos, espinhoso, pedregoso ou fértil: base metafórica que o próprio Evangelho esclareceu quando os discípulos pediram a Cristo que a decifrassem.
O "Sermão de Santo Antônio aos Peixes" é todo articulado em torno dos tipos e comportamentos dos peixes. Vieria os compara engenhosamente aos caracteres cruéis ou falsos dos homens: no caso, os colonos que tanto maltrataram os jesuítas na questão do trabalho indígena.
(Revista Cult, n. 164, p. 37)

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